Data da Publicação: 29/06/2017
Simpósio
Edward Said, em sua obra Orientalismo (2007), sugere que precisamos interrogar a crença de que o único modo de “conhecer” o oriente é pela própria concepção do Ocidente que propõe que fora do ponto de vista do ocidente, o oriente não existe. Assim, o Oriente é logicamente uma construção do Ocidente permitindo a dominação e uma visão única ou “história única” na expressão de Chimamanda Adichie. Da mesma forma e sob a mesma perspectiva, poderíamos refletir sobre a Amazônia.
Como nos lembra a estudiosa manauara Neide Gondim, a Amazônia foi inventada pelos europeus, a partir de olhos externos, mesmo antes “da conquista da América” pelos europeus que vinham em busca de ouro ou do paraíso imaginado nesta região. Os cerca de 2 milhões de índios de diversas etnias, encontrados na Amazônia, tão diferentes dos europeus em todos os sentidos proporcionaram ainda mais especulações e imaginações motivando várias interpretações e estimulando narrativas que revelam o discurso dominante dos observadores.
Assim foi se criando, nas palavras de Gondim, uma malha discursiva: um discurso repete o outro com poucas diferenças. O visto não é importante, o novo não tem a mesma atenção que o antigo, somente é importante aquilo que se quer ver ou afirmar sobre a região. Como enfatiza Marie Louise Pratt os que eram vistos não eram ouvidos e o discurso antigo continua sendo a verdade, pois o novo é filtrado pelo antigo. A lenda das Amazonas, as índias matriarcas, guerreiras que escolhiam homens com quem queriam manter relações sexuais e engravidarem, nunca foram vistas pelos europeus, mas imaginadas e divulgadas em várias narrativas.
As narrativas centradas na percepção europeia vão fortalecer e “documentar” as velhas crenças dando estabilidade a elas. Como os habitantes nativos não conheciam a escrita, a história dos europeus tornou-se a história única. Assim a Amazônia foi sendo narrada na historiografia, na literatura de viagem e mais tarde em ficções literárias. Os conceitos e preconceitos sobre o “outro”, o “não europeu” foram divulgados de todas as formas. As histórias dos povos indígenas, e mais tarde outras minorias, começaram a ser totalmente distorcidas ou negligenciadas, suas memórias ignoradas ou totalmente apagadas.
Os próprios indígenas começaram a duvidar de suas histórias, do poder do pajé e do valor de suas crenças ou a autenticidade de seus deuses. Suas histórias deixaram de ser ouvidas e divulgadas. Desse modo, acompanhando as reflexões de Albert Memmi, ao falar do sujeito colonial e enfatizar que “a história que conhecem não é a sua, a literatura que leem é de uma terra distante”, ressaltamos que, em nosso caso, isso se constitui em um sério problema que vem acontecendo com outras minorias que vieram para a Amazônia mais tarde em busca de sobrevivência.
As memórias e narrativas de seringueiros, ribeirinhos, indígenas, quilombolas, de migrantes de várias partes do mundo (ultimamente haitianos) constituem-se em contra narrativas a um discurso dominante e essencializador sobre a Amazônia. Estas “contra narrativas” devem ser ouvidas, recuperadas discutidas, registradas, pois compõem o cenário das Amazônias. A integração com os países vizinhos como Peru, Bolívia, Colômbia, Venezuela e as próprias
Guianas favorecem o conhecimento de uma Amazônia menos europeia, mais indígena e mais cabocla. Como sustenta o estudioso paraense João Jesus de Paes Loureiro “a cultura amazônica apresenta uma fisionomia intelectual, artística própria e constituídas no decorrer na história regional”.
Precisamos trazer essas narrativas de minorias para a academia, para a sala de aula, para eventos que promovam um conhecimento maior da Amazônia, que possibilitem que as narrativas e as contra narrativas sejam ouvidas lidas e apreciadas. Elas vão de encontro à história única contada por uns poucos europeus ou exploradores sem interesse em ouvir o outro. Em nossos Mestrados em Estudos Literários e Letras e em nossos grupos de pesquisa tais como: Grupo de Estudos em Literatura e Educação: caminhos da alteridade – LECCA/CNPq, Grupo de Estudos em Linguagens, Cultura e Educação – GECEL/CNPq e grupos parceiros como: Grupo de Estudos Integrados sobre Linguagem, Educação e Cultura – GEAL/CNPq e Grupo de Pesquisas em Espacialidades Artísticas (GPEA); que têm promovido debates e discussões, direta ou indiretamente, em torno do tema.
O evento ocorrerá de 20 a 24/11/2017 na cidade de Porto Velho/RO.
Maiores informações sobre o evento podem ser encontradas no site (clique no link):